As Origens Irlandesas da Grande Loja dos Antigos – PARTE II

No ano seguinte, 1744, o Dr. Fifield Dassigny publicou um livro tão raro que uma cópia não foi localizada até 1867, quando foi finalmente descoberta pelo famoso membro do Quatuor Coronati Lodge, irmão William James Hughan. Hoje, esse livro é principalmente de interesse como resultado das poucas linhas de impressão a seguir:

Em seu texto, Dassigny afirma claramente que “os irmãos não têm direito aos benefícios da Maçonaria do Arco Real até que estejam devidamente qualificados (após terem passado pela presidência de uma loja) e o façam da maneira adequada; e, somente então, eles terão direito a progredir ainda mais na direção dos excelentes maçons”. É interessante notar que o nome de Dermott aparece na lista de assinantes do documento, juntamente com o de Elizabeth Aldworth, a senhora maçom e seu filho Boyle.

Aqui observamos e compreendemos a afirmação de que o Arco Real era diferente de qualquer outro chamado “grau superior”, pois era de fato parte integrante da Maçonaria Simbólica (Craft) desde os primórdios, estando disponível somente para os Past Masters das lojas.

Em um armário antigo no Coleraine Masonic Hall podem ser encontrados os colares originais e as jóias de prata que costumavam ser usadas pelos oficiais da Vernon Lodge Nº 123, Coleraine. Essas jóias foram um presente de Dominic Hyland, primeiro mestre da loja. Em 8 de maio de 1741, a patente nº 123 foi emitida pela Grande Loja da Irlanda para William Kinkead, Alexander McCracken e Dominick Heyland, para criarem uma loja em Coleraine, no condado de Londonderry. Parece ter sido uma loja que estava regularizando sua posição em resposta a um anúncio na imprensa no Dublin Journal de Faulkner em 1 de julho de 1740, quando a Grande Loja da Irlanda pediu a todas as lojas de seu território que solicitassem patentes, ou seriam processados como maçons rebeldes.

As jóias desses oficiais são únicas, pois carregam os símbolos dos oficiais habituais na face anversa e os símbolos do Arco Real no verso. Cada jóia tem o nome Dominic Hyland e a data de 1747. Todas elas são magníficas jóias de prata georgianas do século XVIII, bem gravadas com símbolos maçônicos e com o nome Vernon Lodge e a data de 5747. Existem vários lemas maçônicos nas jóias e todas registram o fato de que elas foram um “presente de nosso digno irmão Dominick Heyland Esq”.

Todas as três jóias estão gravadas nos dois lados e incluem uma fascinante mistura de símbolos da Maçonaria, exceto, porém, a face oposta das jóias dos Vigilantes, onde encontramos especificamente símbolos do Arco Real, incluindo o Sol, a Serpente e a Picareta, em cada um dos três cantos e, no centro, um Sagrado Arco Real montado sobre um altar no Santo dos Santos. O arco compreende cinco cursos separados, com uma pedra angular no topo.

A jóia do Mestre da Loja é um belo esquadro prateado, suspenso do centro e com representações gravadas dos Compassos, Esquadros e Volume da Lei Sagrada em uma face e o Sol, a Lua e o Martelo do Mestre na outra. Suspenso sob o esquadro, apoiado por três pequenas correntes de prata, está um triângulo equilátero finamente trabalhado, com uma face do olho que tudo vê, a 47ª proposição de euclides, os dois pilares, os três castiçais, o nível e os compassos, o esquadro e o prumo. No verso do triângulo, há uma repetição do desenho do Arco Real, assim como na parte de trás da joia do 1º Vigilante.


A alguns quilômetros dali, na cidade de Enniskillen, está o magnífico pano, que foi emoldurado e preservado na parede atrás da cadeira do 1º Vigilante. Esse artefato magnífico foi produzido em 1749 para a constituição da Loja Maçônica Nº 205, anexada ao 35º Regimento de Infantaria, que estava estacionado em Charlemont Fort, no rio Blackwater, em frente à cidade de Moy.

Assim sendo, gostaria de lembrá-lo de toda a importância dessa relíquia em particular, datada de 1749, pois o desenho central do pano, tem o Mestre da loja em sua capa azul, sentado no Trono do Mestre, de frente para uma figura em uma capa vermelha vestindo um avental vermelho com um arco contendo um santo dos santos sob a pedra angular.

Sobre a cabeça da figura são desenhadas três coroas douradas, emblemáticas da Trindade, os Três Grão-Mestres e os Três Reis, que claramente governavam o capítulo naquele momento. Abaixo das três coroas, está a mitra de um bispo, emblemática do Sumo Sacerdote, outro oficial muito importante no capítulo. Um texto revelador é encontrado escrito na parte superior do pano, com a seguinte redação: “Nosso maravilhoso arco é além do céu abobadado / Nossa poderosa pedra angular é o Olho Que Tudo Vê”.

Laurence Dermott era irlandês, nascido em 1720. Foi iniciado na Loja nº26, de Dublin, em 1740, e tendo ocupado todos os cargos na Loja, incluindo o de Secretário, sendo Instalado como Mestre da Loja nº26 em 24 de junho de 1746, e no mesmo ano ele foi exaltado ao grau de Maçom do Arco Real. Sabemos que ele era um irmão de recursos limitados, que viajou para Londres e conseguiu uma posição, trabalhando para um mestre pintor. Claramente, ele havia recebido uma boa educação, o que claramente aparece em seus escritos e correspondências. Dermott foi um dos muitos irmãos irlandeses que emigraram para a Inglaterra na década de 1740 em resposta à onda contínua de fome que varria a Irlanda naquele momento, devido às pragas que atingiram as plantações, principalmente as de batata.

Os irmãos irlandeses começaram a se unir e formar Lojas não afiliadas à Grande Loja de Londres, inicialmente de maneira informal. Um pouco mais de 80 irmãos, reunidos em seis modestas lojas de mecânicos, operários e comerciantes, muitos dos quais irlandeses, se reuniram e formaram uma “Grande Loja da Antiga Instituição”. Eles nunca sugeriram que qualquer uma de suas Lojas fosse mais antiga que a Grande Loja de Londres e Westminster, mas como sua intenção era preservar algumas das características antigas do Craft, recentemente alteradas, naquela assembléia, elas assumiram o título em seus primeiros registros de “Maçons Antigos”, e passaram a chamar os membros do corpo mais velho de “Os Modernos”.

John Morgan tornou-se o primeiro secretário desse novo grande órgão e o registro sobrevivente mais antigo de suas atividades está em um volume conhecido como Morgan’s Register, cuja maior parte é um registro de membros, dos irmãos que apoiam esta nova Grande Loja. Ele também contém um índice e uma série de cerca de 18 Regras e Ordens:

“Regras e Ordens a serem observadas pela Mais Antiga e Honrada Sociedade de Maçons Livres e Aceitos. Conforme acordado e estabelecido por um comitê nomeado por uma assembléia geral, realizada no Turk´s Head na Greek Street, Soho, quarta-feira, 17 de junho de 1751”. Uma regra a mais seria adicionada em 6 de abril de 1752.

Por muitos anos, foi considerado que esse corpo se separou da Grande Loja de Westminster em um cisma devido as mudanças rituais implementadas por eles em resposta à publicação de várias exposições maçônicas. Mas, o irmão Henry Sadler, ex-grande bibliotecário da Grande Loja Unida da Inglaterra, descartou essa teoria quando, em 1887, descobriu os Livros de Atas pertencentes à Grande Loja dos Antigos e publicou um resumo deles em seu excelente livro “Masonic Facts and Fiction”.

No entanto, foi graças aos escritos e ações de um homem – o imigrante irlandês Laurence Dermott – que ainda hoje prestamos muita atenção aos antigos. Dermott trabalhou em tempos difíceis e foi um firme defensor da disciplina maçônica. Ele era frequentemente atacado e difamado por seus inimigos, mas felizmente ele era um lutador e administrador extraordinário. É graças a ele que, de tantas maneiras, a Maçonaria Inglesa se desenvolveu como tem sido; e sua marca ainda pode ser vista hoje.

Em 1752, Dermott, depois de visitar uma Loja Moderna, ingressou na Loja nº9 afiliada à Grande Loja dos Antigos. Logo ele deixou a Loja nº9 e se juntou à Loja nº10, que também apoiava os Antigos. Na reunião do Grande Comitê, realizada em 5 de fevereiro de 1752, o irmão John Morgan, que havia sido nomeado recentemente para uma posição nos navios de Sua Majestade, renunciou ao cargo de Grande Secretário da Grande Loja dos Antigos. Após uma entrevista de Morgan e a eleição na Grande Loja, Dermott tornou-se o novo Grande Secretário. Ele parece ter começado a trabalhar imediatamente e, em 1º de abril de 1752, a questão de estatutos para lojas filiadas foi levantada no comitê.

Um Grande Conjunto de Regras havia sido preparado pelo Grande Secretário cessante, mas este ficou de lado quando Dermott produziu uma cópia dos Regulamentos usados em Dublin por sua Loja Irlandesa. “Sendo este último considerado o mais correto, foi decidido por unanimidade que a cópia mais correta deveria ser recebida e reconhecida como a única indicação para lojas particulares no futuro. E agradecimentos públicos foram dados aos irmãos Philip McLoughlin e John Morgan por suas boas intenções e dificuldade em elaborar as antigas leis”.

O Grande Secretário da Grande Loja da Irlanda, Edward Spratt, era um notável palestrante ritualista em Dublin. Claramente, Dermott o vira em ação, em muitas ocasiões, e mantinha suas habilidades rituais em grande consideração. Na ata da Grande Loja dos Antigos, datada de 24 de junho de 1752, está registrado que Dermott foi investido como Grande Secretário. Quando a cerimônia terminou, Dermott repetiu toda a cerimônia novamente, da maneira que aprendera com o irmão Edward Spratt Esq, o célebre Grande Secretário da Irlanda. O longo recital dessa cerimônia solene deu grande satisfação ao público, muitos dos quais nunca tiveram a oportunidade de ouvir o mesmo antes.

Dermott reintroduziu a cerimônia de instalação do mestre da loja, à maneira irlandesa. Essa cerimônia tinha sido anteriormente descartada pelos Modernos por volta de 1739. Na Irlanda, foi estabelecido o costume de que as lojas irlandesas instalassem seus mestres duas vezes por ano nos dois dias de São João, nos dias 24 de junho e 27 de dezembro de cada ano. Essa cerimônia não foi usada pelos Modernos até depois de 1813, quando foi apresentada e eventualmente aprovada, pelos irmãos participantes da Loja da Reconciliação.

Vale a pena citar que, no século XVIII, era tradição irlandesa eleger os Mestres de Loja para servir por um período de seis meses, do dia de São João ao dia de São João.

Gravura de um Mestre de Loja – Irlanda, 1787

Somente em 1875 que essa regra finalmente mudou e agora os Veneráveis Mestres são eleitos apenas uma vez por ano. Esse período fixo de eleição na Irlanda, instalando o novo Mestre na próxima reunião após o dia de São João, 27 de dezembro de cada ano, está em desacordo com a prática escocesa e inglesa de eleger e instalar seus oficiais de loja como e quando a loja assim o desejar.

Na Irlanda, os oficiais da loja são eleitos com os votos dos mestres maçons membros da loja, enquanto na Inglaterra a forma usual é que todos, exceto o tesoureiro da loja, sejam nomeados pelo Venerável Mestre eleito. Em seguida, menção aos Diáconos, parte integrante da Maçonaria Irlandesa desde seus primeiros tempos e novamente introduzida na Inglaterra por Dermott através da Grande Loja dos Antigos. Por fim, atente para o juramento do candidato, realizado após a cerimônia de iniciação, que de uma forma ou de outra, é realizado em quase todas as constituições maçônicas ao redor do mundo. Esse juramento é de origem irlandesa, tendo sido apresentado inicialmente ao mundo no Pocket Companion de Smith, publicado em Dublin em 1735. Esse trabalho teve a aprovação do Grão-Mestre Kingsland, seu Vice-Grão Mestre e Grandes Vigilantes, sendo vendido aos Irmãos sob a bandeira: “Aprovado e recomendado pela Grande Loja”.

Um dos primeiros movimentos de Dermott foi sua introdução, em 14 de setembro de 1752, da resolução que levou diretamente à emissão de cartas constitutivas pela Grande Loja dos Antigos. Ele foi o homem que, devido à sua experiência em Dublin, introduziu a legislação de emissão de cartas constitutivas na maçonaria inglesa, de acordo com o trabalho irlandês.

E, por trás da adoção de cartas constitutivas pela Grande Loja dos Antigos, Dermott encomendou um novo selo da Grande Loja com base no selo usado pela Grande Loja da Irlanda. Era uma cópia exata, até no lema judaico “Holiness to the Lord”, que se traduz como “Santidade ao Senhor”.

No final de 1752, 12 Lojas inglesas estavam afiliadas à Grande Loja dos Antigos. Em 1755, a Grande Loja dos Antigos seguiu outra tradição irlandesa e começou a emitir patentes itinerantes para irmãos militares, enquanto eles viajavam ao redor do mundo para desempenhar suas funções militares. Isso teve um efeito no crescimento da Grande Loja e observamos que o número de cartas emitidas havia aumentado para 45 em 1766 e para 88 no início do século XIX. Quando as duas Grandes Lojas finalmente se unificaram em 1813, havia cerca de 359 cartas constitutivas emitidas para Lojas dos Antigos, algumas das quais haviam parado de trabalhar ou não estavam mais ativas.

Uma lei antiga, das Constituições de Anderson, estabelece que “ninguém, daqui em diante, deve ser aceito como um maçom ou admitido em nenhuma Loja ou Assembléia até que tenha trazido um certificado da hora e do local de sua iniciação, da Loja que o recebeu”.

O irmão Dermott, em seu papel de Grande Secretário, foi agredido verbalmente pelo irmão John Hamilton em uma reunião da Grande Loja em 2 de março de 1757. Hamilton já havia sido excluído da Grande Loja, mas buscou autorização especial para comparecer no dia 2. Após muito debate, sua participação foi aprovada e ele apareceu na frente dos irmãos reunidos e questionou se Dermott era ou não regularmente iniciado em Dublin. Dermott aceitou o desafio e convocou dois dos irmãos presentes, ambos ex-mestres da Loja nº26 de Dublin, para garantir que ele havia sido iniciado na Loja nº26 e havia ocupado vários cargos, como ele alegara. Foi o que os dois irmãos fizeram de bom grado e, para resolver de maneira conclusiva o assunto, Dermott produziu um certificado manuscrito assinado por Edward Spratt, Grande Secretário da Grande Loja da Irlanda, datado de 1746 e selado com o selo da Grande Loja. É possível que esta seja o primeiro certificado emitido por uma Grande Loja com informações sobre as datas dos graus recebidos por um membro, neste caso, em 2 de março de 1757.

Dermott foi um grande promotor do grau do Arco Real, que ele trouxe da Irlanda, e foi a introdução desse grau que causaria um grande ponto de discórdia por muitos anos com os “Modernos”.

Dermott foi fortemente influenciado pela produção em 1751 de “O Novo Livro das Constituições da mais antiga e honrada Fraternidade de Maçons Livres e Aceitos, contendo sua história, ordens, regulamentos etc. – para o Uso das Lojas na Irlanda por Edward Spratt secretário Dublin 1751”. Depois de ler e estudar o conteúdo deste volume, Dermott foi levado a considerar a produção de um livro semelhante para uso pelos Irmãos que constituíam os membros da Grande Loja dos Antigos. E então ele começou.

Dermott passou algum tempo redigindo, editando, imprimindo e publicando sua obra – Ahiman Rezon – que passou a ser o Livro das Constituições da Grande Loja dos Antigos. A primeira edição foi finalmente impressa em Londres em 1756 e vendida em nome do irmão Laurence Dermott, por James Bedford, livreiro, cuja loja ficava na Catedral de São Paulo em Londres.

Não se pode medir a importância desse trabalho, que foi publicado em muitas edições, na Inglaterra, Irlanda e Américas. Foi adotado e usado por Grandes Lojas em todo o mundo.

Mas, certamente, seu maior desejo, que muitas vezes declarou, era que ele “vivesse para ver uma conformidade geral e uma unidade universal entre os maçons de todas as denominações”. Infelizmente, esse desejo não foi atendido e Dermott faleceu em junho de 1791. No entanto, quando os Artigos da União foram finalmente assinados no Palácio Kensington em 25 de novembro de 1813, foi o legado de Dermott que venceu no dia, fornecendo a forma e administração que serviria tão bem à Grande Loja Unida da Inglaterra nos anos seguintes.

Bibliografia

  • Tradução livre e adaptação feita por Luciano R. Rodrigues, de texto apresentado na First International Conference of Masonic Research Lodges, pelo irmão Robert T. Bashford, membro da Irish Lodge of Research CC.
  • Notes on Laurence Dermott G.S. and His Work – Witham Matthew Bywater
  • Masonic Facts and Fictions : Comprising a New Theory of the Origin of the ‘Antient’ Grand Lodge – Henry Sadler
  • Caementaria Hibernica: being the Public Constitutions that have served to hold together the Freemasons of Ireland – Chetwode, W. J.
  • Volume 1 – History of the Grand Lodge of Free and Accepted Masons of Ireland – John Heron Lepper e Philip Crossle
  • Volume 2 – History of The Grand Lodge of Free and Accepted Masons of Ireland – R.E. Parkinson
  • Grand Lodge of Ancient Free and Accepted Masons of Ireland – Bicentenary Festival Banquet Freemasons Hall 4th June 1925 – The Story of the Past two Hundred Years – Philip Crossle
  • The Genesis of Freemasonry – An account of the rise and development of Freemasonry in its operative, accepted and early speculative phases – Douglas Knoop
  • The Freemasons – Eugene Lennhoff (Nova edição publicada por Lewis Masonic 1994)

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